Mídia Programática e a Nova Era da Propaganda

Introdução

Nunca o mundo mudou tanto em tão pouco tempo. E toda essa mudança exigiu uma completa revisão de paradigmas no ato de se comunicar. A chegada do digital ao nosso cotidiano transformou completamente hábitos de vida, relações pessoais e de negócios e afetou profundamente a busca, a troca e o consumo de informações.

O universo da mídia explodiu em formas distintas e opções infinitas, e isso exigiu novas ferramentas de gestão que permitissem irmos em busca da atenção perdida. Nesse contexto, a Mídia Programática é, sem dúvida, a resposta mais adequada para os anunciantes transmitirem as suas mensagens com mais eficiência a uma sociedade cada vez mais efêmera, individualizada e exigente. Por conta disso, tornou-se impossível conceber uma estratégia de comunicação publicitária que não incluísse o uso eficiente dessa metodologia.

Por sua característica tão inovadora e revolucionária, a Mídia Programática tem incomodado e tirado o sono do mercado publicitário, acostumado com soluções genéricas e simplistas. Por outro lado, sua adoção está cada vez mais irreversível, num mundo que exige cada vez mais eficiência e assertividade nos processos de comunicação.

O que mudou? E o que vai mudar?

Nesta última década, o segmento de mídia se alterou mais que em todo o século anterior. E não se trata apenas de avaliar a tecnologia ou a proliferação de meios. O que mudou foi a essência da relação entre informante e informado. Entre quem emite a opinião e quem recebe essa opinião. Em resumo, o que se alterou profundamente foi a relação entre o agente ativo e o passivo no mercado de comunicação e mídia.

Em meu último livro, lançado no início deste ano e intitulado O Fim da Idade Média e o Início da Idade Mídia (Ed. Alta Books), procuro abordar esse assunto em profundidade e busco, agora, resumi-lo aqui para contextualizar a argumentação posterior:

Muita gente acredita que a Idade Média terminou em 1453 com a Invasão de Constantinopla. Na verdade, o fim da Idade Média está acontecendo somente agora, neste século e em nossa geração. E o porquê dessa afirmação?

Até hoje tudo era avaliado e orientado pela média da população. Em qualquer área do comportamento humano, nossas decisões eram definidas pelo resultado médio daquele fato na população, e não individualmente, de acordo com cada um de nós. Éramos tratados como grupos ou massa, e nunca como indivíduos.

Na medicina, o que imperava eram os protocolos genéricos. Hoje a medicina genômica já estabelece protocolos individuais de tratamento.

Na educação, fomos sempre divididos em classes por idade independentemente de nossa maturidade ou nosso conhecimento. Nesse fim da Idade Média, graças ao EAD, uma grande revolução toma corpo, permitindo o acesso a qualquer informação do tema que desejarmos e, principalmente, em nosso ritmo de aprendizagem.

Antes, na TV, assistíamos ao filme que a emissora decidisse, na hora que ela quisesse exibi-lo. Hoje, com streamings como Netflix ou Prime Video, qualquer um assiste ao que quiser, onde quiser e na hora que tiver vontade.

Com o rádio, escutávamos as músicas que o DJ definia como as preferidas pela média dos ouvintes. Com o Spotify, criamos nossa própria seleção individual.

Antes todos líamos as mesmas notícias de jornal, com o mesmo nível de profundidade. Hoje podemos ir tão fundo num assunto quanto quisermos, graças ao hiperlink na internet. E, mais uma vez, de maneira individualizada.

Junto às instituições financeiras, os juros estratosféricos que fazem os adimplentes pagarem pelos inadimplentes estão com os dias contados a partir de mecanismos como o Cadastro Positivo. E o mesmo vai se dar no universo dos seguros, no qual motoristas responsáveis ainda arcam com o mesmo prêmio de seguro dos irresponsáveis.

Na propaganda e no marketing, éramos atingidos pelas mensagens de forma genérica e baseada em médias estatísticas. A mídia de massa se encarregou de nos transformar em grupos de consumo sem levar em conta a sincronicidade com cada uma de nossas vidas. Hoje, graças ao crescente uso de IA (Inteligência Artificial) e Analytics, essa realidade também está mudando.

Este é o mundo que conhecemos e no qual vivemos até hoje: a Idade Média das relações comerciais, pessoais e sociais. Nela, todos ainda somos avaliados pela média, pagamos pela média e acabamos tratados por essa mesma média. Mas um novo mundo está surgindo com o fim da Idade Média. E isso é uma gigantesca mudança.

Uma nova era na qual cada um de nós é um universo à parte, respeitado em sua individualidade e com capacidade de influir na sociedade. Cada um de nós, daqui para a frente, será um agente de mídia, formador de opinião e gerador de conhecimento cada vez mais compartilhado.

É nessa visão da individualidade dos cidadãos e da liberdade de cada um escolher o que quer ver, ouvir ou assistir que se baseiam a queda dramática de eficiência em mídia nos meios tradicionais e a busca incessante de novas alternativas que gerem não somente audiência, mas principalmente engajamento.

A verdade é que estamos numa era em que resultados de comunicação sobem pela escada e custos, pelo elevador. Em que o marketing precisa fazer cada vez mais esforços para conseguir o mesmo resultado. E se antes nós precisávamos andar para não ficar no lugar, agora precisamos correr para não sair do lugar.

Trocamos o mundo da atenção pelo mundo da distração, no qual o conceito de público espectador serve cada vez menos para garantir resultados. Nele, o foco é cada vez mais pulverizado, multiforme, multitela e multilinguagem. E atenção e engajamento são matérias-primas cada vez mais escassas.

A premissa básica desta nova era é tratar desigualmente pessoas que parecem iguais, mas não são. Isso porque nós, como indivíduos e consumidores, não somos nem estamos sempre iguais. Além das individualidades, há inúmeros fatos que vão nos moldando ao longo da vida.

E, para conseguir de volta a atenção do público, é preciso entender que pessoas não “são”; pessoas “estão”. Em outras palavras, é a minha jornada individual que define as necessidades específicas de consumo. Independentemente de alguém ser advogado, ter 65 anos, morar em Alphaville e ser pai de dois filhos, o que define suas necessidades não são apenas os dados demográficos, e sim psicográficos e comportamentais.

Sendo assim, cabe aos anunciantes buscar, o tempo todo, adequar as ofertas ao meu momento de vida. O que altera o comportamento de consumo de cada um de nós não é apenas quanto eu ganho por mês ou minha formação universitária, e sim se iniciei uma dieta, se meu filho se formou na faculdade, se adotei um cachorro, se mudei de casa, se comecei a frequentar uma academia, se pretendo passar férias na Europa e assim por diante.

Portanto, o que precisamos conhecer não são apenas as características genéricas do público-alvo, mas os “eventos” que afetam o cotidiano das pessoas. Ou seja, o que elas buscam de conteúdo, quais são os temas de seu interesse, quais são seus projetos e preocupações etc. Afinal, são esses fatos que geram necessidades específicas de informação, entretenimento e consumo.

Sendo assim, parece óbvio que precisamos reinventar a forma de comunicação com nosso público-alvo. Precisamos descobrir novos formatos de mídia que vão ao encontro desse destinatário cada vez mais empoderado e individualizado. Do contrário, jamais poderemos obter sua atenção de volta.

Por que estamos aqui? E para onde vamos?

No início do século passado, um grande varejista da Filadélfia e precursor das lojas de departamento, John Wanamaker, fez um comentário durante uma reunião que se transformou num mantra repetido até hoje entre nós. Segundo ele, “metade do valor investido em propaganda é dinheiro jogado fora. O problema é que não sabemos qual é essa metade”. Ou seja, ele se sentia incomodado com a falta de resultados e o desperdício de dinheiro investido em comunicação.

De lá para cá, essa foi a frase mais repetida pelas áreas de marketing dos anunciantes em todo o mundo. A falta de ferramentas de aferição quanto à real eficácia da propaganda foi algo que atravessou todo o século XX e chegou até nós.

Os anos 1970 e 1980 foram considerados as décadas de ouro da mídia de massa no Brasil. Colocar um comercial no intervalo do Fantástico, programa dominical da rede Globo, era certeza de que muita gente veria a mensagem. Revistas e jornais batiam recordes de tiragem, e a mídia exterior estava presente, de maneira maciça, em todas as grandes cidades brasileiras.

Os anunciantes disputavam o horário nobre da TV a peso de ouro, mesmo sem muita cientificidade de aferição dos resultados. O que importava era estar no ar, marcar presença. O faturamento da mídia subia, e os custos para o anunciante se inflacionavam sem que o resultado apresentasse uma curva na mesma proporção. Havia apenas rudimentos de análise de eficiência com instrumentos precários de avaliação.

Um bom exemplo é a mensuração de audiência e a falta total de análise de resultados diretos dessa veiculação. Quando dizemos que determinado programa tem 20% de audiência, não significa que no intervalo comercial as pessoas estão assistindo à propaganda. Podem ter se levantado do sofá, ficado conversando entre si, ter buscado outras opções de conteúdo nas centenas de canais disponíveis, aproveitado para checar portais de notícias na internet, suas redes sociais ou mensagens de WhatsApp etc. Da mesma forma, a tiragem de um veículo impresso é apenas mais uma informação, e não uma certeza de atenção.

Trata-se, portanto, de ferramentas cada vez menos úteis para avaliar se estamos efetivamente atingindo alguém com nossa mensagem.

Além disso, mesmo que determinada pessoa assista, ouça ou leia nossa publicidade, isso não significa resultado efetivo, pois esse indivíduo foi atingido não por escolher, e sim por ter sido escolhido de maneira genérica, aleatória e baseada na média da população. Essa atitude passiva, e não ativa, é uma gigantesca diferença na hora de definir a atenção e o engajamento.

Durante quase um século, porém, o mercado de mídia não oferecia opções ou alternativas que permitissem uma real mensuração de resultado. Seja na TV, no rádio ou no outdoor, tudo era estimado e baseado em premissas genéricas. Não havia certeza de nada, apenas suposição.

Ou seja, o Mr. Wanamaker estava correto, mas, com a explosão de novas mídias — centenas de novos canais, mídia indoor, propaganda em ônibus, proliferação de novas revistas e jornais e muitas outras opções publicitárias —, o que era considerado 50% de desperdício passou a crescer cada vez mais. E chegamos ao ano 2000 com uma iminente crise na relação entre as mídias e seus anunciantes, que se sentiam bastante frustrados por investir cada vez mais e gerar cada vez menos resultados expressivos.

Aí chegou o digital. E a transformação foi total

Apesar de ter surgido em 1969, foi apenas a partir do ano 2000 que a internet e a consequente mídia digital começaram a ser consideradas como complemento válido para o orçamento publicitário dos anunciantes. Naquele momento do mundo, havia o domínio quase absoluto das TVs, revistas e jornais, que, apesar da nascente concorrência dos sites, vídeos, blogs e ferramentas de busca, ainda reinavam absolutos.

A grande vantagem da nova opção de mídia que estava chegando era a capacidade de falar com o target certo e na hora exata, individualmente, versus o conceito Spray & Pray da mídia de massa.

Como disse recentemente M. Lawrence Light, ex-chief marketing officer do McDonald’s: “Não faz mais sentido, do ponto de vista econômico, enviar uma mensagem de publicidade para várias pessoas na esperança de persuadir apenas algumas”.

No início, as agências de propaganda e os profissionais de marketing olharam para essa nova alternativa com um misto de excitação e medo. Aliás, sempre que uma nova era surge perante nós, esses dois sentimentos ambíguos aparecem juntos numa dualidade inclusiva.

Temos simultaneamente a excitação da novidade e a dúvida da mudança. Aos poucos, porém, as vantagens foram se tornando inegáveis, e a mídia digital passou a disputar espaço de igual para igual com os grandes veículos nos orçamentos de mídia. E hoje já é responsável por aproximadamente 30% do orçamento publicitário nacional. Nenhuma outra plataforma de mídia cresceu tão rápido e de forma tão consistente, em tão pouco tempo, quanto a mídia digital.

As agências de propaganda começaram a ser demandadas pelos anunciantes para assumir o meio digital como alternativa real em qualquer plano de mídia, mas foram relutantes em atender a essa solicitação. Afinal, o sistema de remuneração direta e indireta que reinava na relação com os veículos de massa era infinitamente mais lucrativo para as agências que o oferecido pela mídia digital, que eliminou as BVs (bonificações por volume), as comissões e os planos de incentivo.

A drástica revisão de paradigmas nessa relação demorou para ser absorvida pelas agências de propaganda. Dali em diante, não era mais o veículo de mídia que as remunerava, muitas vezes de maneira não ortodoxa, mas o anunciante diretamente, o maior interessado na atividade técnica da agência.

A partir desse momento, houve um rearranjo negocial da indústria publicitária, que se viu na obrigação de revisar seus métodos de trabalho e suas formas de remuneração.

Ao eliminar a bonificação por volume que era paga pelos veículos de comunicação para as agências sem envolvimento do cliente, mas afetando seu custo, houve uma profissionalização imediata do segmento.

Dali para a frente, ao veicular um anúncio, a decisão passou a ser técnica, e não eventualmente distorcida pelo interesse potencial na BV que aquele veículo específico pagava, de forma incentivada, para a agência.

Só isso já serviu para trazer mais percepção de eficiência e independência ao trato do recurso investido em comunicação, dando mais isenção e transparência às decisões técnicas de mídia. A ênfase na relação custo-benefício pôde se dar com ainda mais independência na gestão da verba publicitária.

Ao criar um vasto arsenal de novas possibilidades e alternativas de comunicação para o mercado anunciante, o espaço publicitário na internet explodiu em tamanho e alcance. Segundo cálculos aproximados, existem hoje cerca de 70 trilhões de páginas de web, e apenas 2% delas oferecem opções de comercialização publicitária[1].

Mas essa gigantesca massa de opções (1,4 trilhão), além de atomizar as audiências, criou uma quase inviabilidade de se rentabilizar os planos de mídia feitos ainda por métodos manuais e tradicionais. Foi aí que surgiu a Mídia Programática e, com ela, a aceleração exponencial dos investimentos em mídia digital e o aumento proporcional da eficiência na alocação de anúncios.

Mídia é o momento em que a atenção encontra o conteúdo

Mídia Programática não é uma tecnologia, e sim uma metodologia de compra e venda de espaços publicitários online e em tempo real, possibilitando exibir um anúncio para um cliente específico, em um contexto particular. E fazer isso aos milhões, ao mesmo tempo, e sem interferência humana na transação.

A ferramenta permite segmentar o público não apenas por gênero, idade, condição socioeconômica e estado civil, mas também por uma infinidade de outros filtros muito mais precisos, como afinidades segmentadas por interesse em casa e jardim, saúde e bem-estar, esportes e fitness etc.

Ela pode, ainda, ir muito mais longe nessa adequação ao target, por meio de afinidades customizadas e identificando determinados momentos de vida dos usuários por meio de dados e inferências, como compra de um imóvel, formatura de um filho, casamento, alteração de status profissional e muito mais.

O potencial de segmentação é muito extenso e permite se trabalhar com uma granularidade inédita no setor de comunicação, adequando a mensagem ao público, ao momento de vida e ao tipo de interesse temático demonstrado.

Em resumo, Mídia Programática é a negociação automatizada de compra e venda de publicidade online. É o processo de utilizar plataformas para que, de um lado, os publishers ou veículos de mídia ofereçam seu inventário de espaço disponível de propaganda e, do outro, para que os anunciantes veiculem suas campanhas nos sites de editores.

A aquisição de espaços publicitários via Mídia Programática permite que qualquer marca personalize o conteúdo de sua mensagem visando os perfis certos, nos locais e nos momentos que considere certos. E essa segmentação pode ser feita por uma enorme gama de opções, tais como idade, sexo, posição social, hábitos de consumo, planos futuros etc. Com isso, a personalização e a individualização da mensagem trazem, como consequência, muito mais precisão e eficiência.

Uma outra grande característica da Mídia Programática é que ela nos permite analisar o comportamento online das pessoas e, por meio disso, gerar mensagens cada vez mais pertinentes e adequadas ao perfil e ao momento daquele potencial destinatário. E tudo isso em tempo real, gerando um público-alvo com muito mais probabilidade de conversão.

Uma anunciante que se utiliza da Mídia Programática acaba reunindo dados precisos e atualizados do target com base no tipo de usuário interessado em sua marca. E com esse conhecimento embarcado, ajusta online e ontime as métricas que permitem mais assertividade e desempenho geral da campanha.

Mídia está relacionada a entregar mensagens que levam informações às pessoas que têm interesse no objeto anunciado. E nada faz isso com mais segurança de resultados que a Mídia Programática.

Ao automatizar as ações de marketing como nunca antes visto, a ferramenta permite que os anúncios sejam divulgados em tempo real e controlados também em sua eficiência a cada minuto da ação.

Para se ter uma noção do crescimento de uso da Mídia Programática, segundo o IAB, ela movimentou, em 2018, cerca de R$16 bilhões de verba publicitária em nosso país. Dois anos antes, em 2016, esse volume era de apenas R$1,9 bilhão, um crescimento bienal de 840%. E o fenômeno é global, e não apenas nacional.

A principal razão disso é que na mídia de massa podemos analisar audiência por meio de generalizações mais ou menos precisas. Na mídia digital, além de analisar a audiência com muito mais acurácia, avaliamos também engajamento — o que, numa campanha de vacinação ou no esforço didático sobre o auxílio emergencial do coronavírus, por exemplo, é um parâmetro essencial de avaliação de desempenho.

Um dos fatores que mais colabora para essa evolução exponencial é o processo de negociação. Quando alguém adquire espaços publicitários na mídia tradicional, o custo da inserção depende de uma negociação individual com a mídia na qual a mensagem será veiculada. É preciso, portanto, tratar com cada um dos veículos separadamente, sejam eles um jornal, revista ou canal de TV.

Já na Mídia Programática, o anunciante compra não o veículo, mas o perfil do público que almeja, por meio de plataformas online com praticamente nenhuma mediação na negociação. A partir dos critérios de segmentação e escolha contextual definidos pelo anunciante, a plataforma faz a colocação dos anúncios por múltiplas transações simultâneas.

Todo esse trabalho é realizado através de três principais ferramentas de integração e troca de informações em tempo real.

A primeira é a DSP (Demand Side Platform), o instrumento no qual o anunciante configura a estratégia e objetivos da campanha, acessa o inventário disponível e pesquisa nas AdExchanges.

A segunda é o SSP (Supply Side Platform ou Sell Side Platform), que reúne todas as ofertas de espaço publicitário disponibilizado pelas mídias, com o objetivo de vender o inventário disponível.

E a terceira é o DMP (Data Management Platform), que acompanha, 24/7, todas as interações do público e o comportamento de navegação no universo digital. Com o acesso a esses dados, sempre através de cookies autorizados pelos usuários, a plataforma consegue criar clusters para segmentá-los, levando em conta seus dados demográficos, de interesse temático e de intenção de compra.

É o DMP que permite identificar melhor quem são os prospects mais desejados e, com isso, possibilita estratégias muito mais assertivas e eficientes.

Neil Patel, o londrino considerado um dos grandes influenciadores da web e autor de best-sellers sobre mídia digital, descreve, em seu artigo “Como Fazer Mídia Programática na Prática”, as cinco principais estratégias a serem selecionadas para buscar resultados otimizados:

·               Conteúdo semântico: quando o lance só é dado caso o espaço publicitário disponível esteja em uma página que tem conteúdo relacionado ao segmento específico do anunciante.

·               Onboarding de dados: consiste em carregar uma lista de contatos para poder encontrá-los online e direcionar somente a eles as suas campanhas.

·               Retargeting: consiste na instalação de tags no site do anunciante para mapear os visitantes de suas páginas e impactá-los mais tarde em outros sites.

·               Third Party Data: é uma segmentação de campanha que se baseia em informações de demografia do usuário, assim como em seus interesses e na intenção de compra.

·               Whitelists: são listas de sites relevantes para os quais os lances serão dados.

Como se pode observar, a Mídia Programática se torna cada vez mais técnica, precisa e especializada, transformando-se aos poucos no principal instrumento de gestão publicitária.

Em resumo, a Mídia Programática promoveu a equalização das oportunidades e democratizou os dois lados do balcão. Com as ferramentas de DSP, AdExchange e SSP, tanto os pequenos e regionais veículos de mídia quanto os micros e pequenos anunciantes podem usufruir dos espaços publicitários em pé de igualdade com os grandes players.

A multiplicação de espaços de mídia disponíveis, muitas vezes mais próximos do público-alvo, acabou gerando uma imediata redução de custos e maior oportunidade de impactar a audiência em contextos variados, com grande capacidade de gerar engajamento real.

Houve, com isso, ganhos expressivos dos dois lados. E graças ao DMP, que analisa os dados de cada um na rede, esse sistema integrado foi, aos poucos, tornando as mensagens publicitárias cada vez mais pertinentes e adequadas para cada usuário, que pode ser alcançado nos diferentes contextos que frequenta. Isso trouxe, como consequência, maior segurança e eficácia da mensagem.

O projeto Sim, recentemente lançado pela Globo, tem o mesmo objetivo de abrir espaço para os pequenos anunciantes, a fim de permitir, por meio de uma plataforma programática, que eles anunciem na emissora de cada região definida por geolocalização. Até hoje, a TV aberta ainda era um território ocupado pelos grandes anunciantes. E isso agora pode mudar, graças ao acirramento da sempre saudável concorrência.

A natural e previsível revolta dos incumbentes

Assim como taxistas depredaram automóveis e fizeram passeatas contra o Uber, o mesmo fenômeno se apresenta agora numa operação coordenada e apoiada pelos velhos aristocratas da mídia contra os “bárbaros” digitais que estão invadindo a cidadela. É uma revolta normal e compreensível, motivada pela defesa de interesses legítimos.

O objetivo meritório de combater as fake news não pode ser deturpado em pretexto para condenar a ferramenta, em vez do seu uso equivocado. Assim como na década de 1970 ou 1980 havia anúncios em jornal oferecendo remédios milagrosos contra queda de cabelo, também hoje temos, na mídia em geral, inclusive a digital, uma infinidade de matérias ou peças publicitárias que distorcem a realidade e geram falsas promessas.

O que tem de ser combatido é a mensagem que eventualmente seja equivocada ou mal colocada, e não o meio. E há inúmeros mecanismos da própria Mídia Programática que permitem aos anunciantes criar campanhas altamente precisas, veiculadas no tipo de página que entendam adequado. Para os eventuais conteúdos questionáveis, há remédios jurídicos e, novamente, as opções de contextualização à disposição dos anunciantes.

Ao inverter a lógica da propaganda de massa, que prestigiava a mídia, para uma forma individualizada de valorizar a pessoa, a mídia digital acompanha a jornada desse indivíduo buscando pertinência e adequação.

A nova Lei Geral de Proteção de Dados já se apresenta como um instrumento importante para ajudar nesse processo, ao balizar a forma de escolha dos usuários em relação aos seus dados.

Segundo pesquisas realizadas na Europa, onde esse tipo de lei já está implementado, houve uma grande evolução da profissionalização do mercado e redução drástica das inserções fraudulentas, com sensível melhora e saneamento do ambiente competitivo. E o Google, que sempre apoiou a elaboração dessa lei, já utiliza seus parâmetros éticos em dimensão global.

Outro ponto importante a ser destacado é a imensa quantidade de controle e de opções oferecida pela Mídia Programática que permite ao anunciante definir o público-alvo e os contextos em que deseja exibir sua mensagem, além de avaliar todo o processo em tempo real.

Pessoas se movimentam pelas múltiplas opções que a internet oferece, entrando e saindo de sites de notícias, plataformas de música, redes sociais e uma infinidade de outras opções. O que a Mídia Programática faz é encontrar o momento mais adequado e economicamente eficiente de estabelecer um contato com essa pessoa, procurando lhe oferecer o produto ou a informação certa na hora certa, a partir de digital breadcrumbs (migalhas digitais) de informações deixadas pelo próprio usuário em sua jornada.

Se, por acaso, esse anunciante interessado em falar com determinada pessoa quiser restringir os momentos de contato a certos contextos ou mesmo a plataformas de conteúdo específicas, eliminando outras, é só usar os controles adequados, dentre as diversas opções disponíveis. Por isso, não podemos falar em desperdício, perda de eficiência ou exposição aleatória de imagem, e sim em adequação da mensagem ao ambiente editorial mais adequado segundo a preferência do próprio anunciante.

Como exemplo, se um pai frequenta junto com o filho determinada plataforma de conteúdo infantil, ele pode ser atingido pela mensagem naquele ambiente e ser impactado por aquela informação publicitária. Mas se o especialista que está programando a veiculação entender que, apesar de atingir a pessoa certa com a mensagem correta, um site dessa categoria não é o ambiente adequado para aquele tipo de conteúdo, basta dar ordens ao algoritmo para que ele elimine sua presença naquela espécie de plataforma. E ele faz isso através de uma combinação de listas de inclusão e de negativação, definidas a partir dos parâmetros inseridos pelo anunciante.

A veiculação programática também possibilita ao anunciante selecionar ambientes de conteúdo nos quais determinada marca ou produto não queira estar. Sendo assim, é possível solicitar a não veiculação associada a temas como tragédia e conflito, problemas sociais sensíveis, difamação e linguagem grosseira, conteúdo erótico etc. E isso é algo inédito, pois na mídia de massa é impossível evitar completamente essa contaminação temática do ambiente editorial no seu anúncio ou comercial. Por exemplo, a propaganda pode ser veiculada no intervalo comercial subsequente a determinada notícia bombástica ou cena inconveniente, com potencial efeito negativo para aquela exibição específica.

É importante frisar que o ser humano pode ser moral ou imoral, mas o algoritmo é sempre amoral. Nenhuma tecnologia ou instrumento fruto da evolução tecnológica pode ser julgado. Uma faca pode cortar um bife ou matar uma pessoa: é o uso que se faz dela que lhe dá valor moral e define um resultado positivo ou negativo.

O uso é que determina o sentido de sua existência e de sua consequência. O mesmo se dá com a inteligência artificial e com a Mídia Programática. Cabe a nós as utilizarmos corretamente, dando-lhes valor moral a ser levado em conta no processo.

Se algo não é planejado e executado de maneira adequada, a culpa não deve ser atribuída à plataforma, que permite a opção, e sim àquele que a programou de maneira incompleta ou limitada. E por ser uma técnica ainda relativamente recente, padecemos de uma insuficiência de conhecimento por parte de alguns que a utilizam, o que vem diminuindo rapidamente com o tempo.

Um grande esforço tem sido feito pelos principais players do universo digital no sentido de didaticamente ensinar ao mercado as boas práticas da Mídia Programática. A sedimentação desse conhecimento permite gerar maior retorno sobre o investimento, maior transparência, melhores controles e gestão das inserções e, principalmente, atuação imediata para eventuais correções de rumo.

Se antes uma agência enviava o mapa de mídia ou a autorização de inserção para uma emissora com semanas de antecedência à veiculação e seu trabalho já estava terminado, agora há necessidade de um trabalho diuturno de controle, checking, revisão e atualização das premissas que estão sendo usadas naquela campanha.

Conclusão

O universo digital é dinâmico, veloz e de crescimento exponencial. Isso exige dos profissionais que atuam nele não apenas aperfeiçoamento constante, mas supervisão permanente de sua implementação. E, por parte dos anunciantes, a justa remuneração para as agências devido ao volume adicional de recursos humanos e técnicos necessários, compensado pelos enormes ganhos de eficiência na exposição da mensagem.

Devemos entender a Mídia Programática como um grande espaço democrático de negociação, no qual veículos de comunicação de qualquer tamanho e sem intermediários oferecem espaços de veiculação para anunciantes de qualquer dimensão, permitindo uma equalização de oportunidades e redução de custos devido à livre concorrência que lá se instala. Os anunciantes continuam livres para escolher onde veicular seus anúncios, usando porções maiores ou menores de espaço disponível.

Niall Ferguson, o conhecido professor e historiador escocês, em seu famoso livro A Praça e a Torre, afirma que precisamos encarar uma nova realidade na sociedade em sua busca por uma evolução que a leve a um maior autocontrole. Segundo ele, “se antes a sombra da torre (governo, autoridade etc.) protegia a praça (o povo e seus cidadãos), agora é o brilho da praça que deve iluminar a torre”.

Como a lógica do planejamento foi invertida e agora podemos escolher a pessoa com quem queremos falar, com o máximo de eficiência, dentro de uma grande pluralidade de veículos possíveis, cabe a cada uma das mídias atrair essas pessoas por meio do seu interesse legítimo no assunto, e não levando em conta as concessões e licenças adquiridas por cada um.

Na internet, quem decide o que quer ver ou assistir é o povo, na hora que tiver vontade. É ele que está no controle. E é a ele que devemos nossa dedicação para a melhoria constante desse processo.

Reforçando ainda mais essa visão de controle do cidadão ou usuário, cabe a cada um de nós escolhermos ou não o que nos atinge. Graças a uma ferramenta exclusiva e proprietária do Google, denominada AdSettings (https://adssettings.google.com/authenticated), os usuários que recebem mensagens publicitárias podem informar se desejam ou não receber novas mensagens similares. Ao lado de outros controles colocados à disposição do público, esse tipo de ferramenta respeita as individualidades e permite que a publicidade seja capaz de gerar mais engajamento.

O objetivo central da veiculação de um anúncio, especialmente através da Mídia Programática, não é valorizar aquele veículo de comunicação, e sim alcançar aquele interessado potencial. A mídia, e o próprio nome já diz, é somente um meio para se chegar lá. A estratégia deve ser client-centric, e não media-centric.

Essa visão mais equânime, libertária e meritocrática é que está atraindo para essa praça tecnológica tanto criadores de conteúdo quanto interessados na utilização desse mesmo conteúdo para poder dialogar com seus atuais e potenciais consumidores.

Para análise de onde alcançar esse público com mais eficiência e pertinência, as ferramentas disponíveis na Mídia Programática atuam nos dois lados do balcão. Para os produtores ou geradores de conteúdo chamados genericamente de mídia digital, ferramentas como o “AdSense” do Google concentram, comparam e disponibilizam todo o inventário de espaços disponíveis de forma simplificada e acessível aos potenciais interessados.

Já do lado dos anunciantes, Google Ads e Display & Video 360 permitem que eles adquiram esses espaços com total controle de suas opções de audiência e contextos de exibição. Nessas plataformas, os espaços são ofertados, o acesso ao usuário é apresentado e o negócio é fechado num décimo de segundo, permitindo a exibição daquele anúncio específico para determinado usuário selecionado, enquanto o site é baixado no aparelho de cada um. E esse processo se tornou possível somente com o uso de algoritmos e inteligência artificial.

Assim como os conhecidos marketplaces (Amazon, Magazine Luiza, Mercado Livre etc.) permitem que pequenos varejistas se aproximem dos consumidores para competir com os grandes através dessa ferramenta gregária e inclusiva, também no mundo da mídia e da publicidade, milhares de pequenos veículos de comunicação e milhões de pequenos anunciantes long tail podem participar desse mercado de consumo competindo contra os grandes concorrentes. Isso acaba gerando uma espiral ascendente de liberdade empreendedora e controle da concentração econômica de forma natural e espontânea.

E, convém reafirmar, talvez aí esteja a grande vantagem dessa praça democrática que foi criada pela Mídia Programática. Ela permite que grandes e pequenos veículos de comunicação tenham garantido seu espaço de oferta, assim como grandes ou pequenos anunciantes possam disputar em pé de igualdade esses espaços de veiculação. Tudo isso sem retirar dos anunciantes o seu controle natural sobre a forma e os locais de apresentação de suas mensagens, só que agora dentro de um acervo muito mais amplo de opções e com ferramentas muito mais precisas para propiciar e avaliar o engajamento gerado.

Mais que uma ferramenta de mídia, estamos criando no mercado publicitário uma verdadeira equalização de oportunidades, limitando o poder de alguns e incentivando a pulverização distributiva das relações entre veículos e anunciantes. Portanto, a Mídia Programática, além de uma técnica otimizada de veiculação, presta uma ajuda inestimável para a construção de uma sociedade mais isenta, justa e igualitária.

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